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Existe uma passagem de Hamlet de Shakespeare que diz o seguinte:

Hamlet, por Lawrence Olivier

Ato II, Cena II. Entra Hamlet lendo.

POLÔNIO: (…) Que é que o meu príncipe está lendo?
HAMLET: Palavras, palavras, palavras…
POLÔNIO: Qual o assunto, meu senhor?
HAMLET: Entre quem?
POLÔNIO: Refiro-me ao assunto de vossa leitura, meu senhor.
HAMLET: Calúnias, meu amigo. Este escravo satírico diz que os velhos têm a barba grisalha, a pele do rosto enrugada, que dos olhos lhes destila âmbar tenue e goma de ameixeira, sobre carecerem de espírito e possuírem pernas fracas. Mas embora, senhor, eu esteja íntima e grandemente convencido da verdade de tudo isso, não considero honesto publicá-lo; por que se pudésseis ficar tão velho quanto eu, sem dúvida alguma andaríeis para trás como caranguejo.
POLÔNIO (à parte) – Apesar de ser loucura, ainda assim revela método.

Polonius, no excerto acima da peça de Shakespeare, diz que Hamlet está louco, mas ainda assim raciocina com método.

Neste pedaço do texto, Hamlet não é louco, tampouco irracional. Ele se faz passar por louco para conseguir um objetivo, que é descobrir a trama por trás da morte do Rei. A racionalidade de seus atos é completa, porém sua ação se inicia com a famosa cena da aparição do fantasma do Rei.

Nesta cena, o fantasma conta a Hamlet que fora assassinado, passando o príncipe a  agir de forma aparentemente irracional para desvelar os assassinos. Ainda que seus atos sejam racionais a partir da aparição, sua crença em um fantasma de seu pai, contando a ele que havia sido assassinado, não deixa de ter relação direta com uma racionalidade limitada (ou pelo menos deveria colocar em dúvida se aquilo não era uma alucinação). Mesmo assim, este fato no começo da peça é fundamental para toda a trama.

Meu ponto aqui é o seguinte: fatos passados influenciam os futuros e, caso haja um evento singular não pautado em princípios

 

Pintura de Salvador Dali (Soft Construction With Boiled Beans (Premonition of Civil War), 1936, óleo sobre tela).

de racionalidade, ele terá implicações para os desdobramentos posteriores, ainda que doravante os agentes ajam de forma completamente racional.

Deixe-me dar um exemplo. Existe uma dupla de autores em economia e psicologia econômica que buscou desvendar a questão da racionalidade dos seres humanos quando estão realizando tarefas que demandariam uma racionalidade forte.

Esta dupla se chama Kahneman e Tversky e são dois cientistas israelenses preocupados com a questão da análise dos agentes na economia. (Para maiores informações, ver TVERSKY, Amos & KAHNEMAN, Daniel. The Framing of Decisions and the Psychology of Choice. Science, New Series, Vol. 211, No. 4481, Jan. 30, 1981, pp. 453-458).

Estes cientistas fizeram vários testes interessantes para avaliar a capacidade de raciocínio das pessoas ao tomarem decisões importantes. Eles descobriram que as pessoas têm várias limitações para conseguir compreender a realidade, fazendo cálculos errados, entendendo as coisas a partir de seu ponto de vista em detrimento da realidade, ou sendo influenciados por fatores externos.

Um dos exemplos interessantes é o seguinte: Imagine que você quer jogar taco (sim, aquele joguinho que jogávamos quando ainda existia ruas calmas nas cidades, que dois times jogam uma bola contra as “casinhas” adversárias, enquanto os rebatedores têm que pontuar acertando a bola e cruzando os tacos). Imagine que você vai comprar o taco e a bola. Você sabe que um conjunto de um taco e uma bola custa R$ 1,10 e que o taco custa R$ 1,00 a mais do que a bola. Como se perdem muitas bolinhas, é preciso comprar mais delas. Assim, você é chamado a esclarecer a seguinte dúvida: quanto custa a bola?

Bom, Kahneman e Tversky fizeram este teste para várias pessoas e encontraram um número enorme de erros. Em verdade, para pessoas “comuns”, como eles chamaram, a chance de acerto era mínima. Para o grupo de pessoas “inteligentes” (na verdade, alunos da Universidade de Michigan e de Princeton nos EUA), a taxa de erro foi de 50% a 56%.

De fato, o problema não é difícil de se compreender, mas a nossa capacidade de raciocinar a respeito dele é impedida por não nos atentarmos direito sobre seu enunciado.

Note que eu disse que o taco custa R$1,00 a mais do que a bola. Se você respondeu que a bola custa R$ 0,10, então, o taco custa R$ 1,00, certo? Sendo assim, ele custa R$ 0,90 a mais do que a bola (R$1,00 – R$ 0,10 = R$ 0,90). Sendo assim, esta não pode ser a resposta correta, pois fere parte do problema. A resposta certa é que a bola custa R$ 0,05. O taco custa, portanto, R$ 1,05, logo R$ 1,00 a mais do que a bola.

Este é um exemplo claro de que erramos em nossos cálculos, mesmo quando temos todas as informações necessárias para resolver o problema (veja que você tinha toda a informação que era necessária – se você errou é porque é humano).

Outro exemplo é o que eles chamam de framing. Esta palavra significa que a moldura como o problema é encarado pelo agente é relevante para a análise. Veja a figura a seguir:

 

Pintura de Salvador Dali (Paranoiac Visage, 1935. Óleo sobre tela)

Nesta pintura, é possível ver uma aldeia, com pessoas sentadas ao redor de uma casa, ou o rosto de uma pessoa deitada.

Este é o conceito de framing que Tversky e Kahneman desenvolveram. Dependendo do ângulo ou do ponto de vista do agente, a escolha pode sair de uma maneira ou de outra.

Se, por exemplo, o presidente de um país que sempre está em guerra com os seus vizinhos recebe um pedido de armistício, de modo a iniciarem negociações de paz, este presidente pode nunca achar que o seu vizinho realmente quer aquele objetivo.

Ele pode ficar conjecturando qual a manobra que seu inimigo está armando para pegá-lo de surpresa. Se o vizinho estava querendo realmente a paz, as negociações podem ser travadas por um problema de framing.

Dito isso, é necessário avaliar as situações considerando que as pessoas podem ser irracionais em alguns momentos, ainda que elas não o sejam todo o tempo.

Assim como Hamlet, to be or not to be irracional não é uma alternativa, é um imperativo. Nós somos parcialmente irracionais, fato que deve constar em qualquer análise para tomada de decisão  vida.

Vik Muniz e o lixo

Poucos artistas brasileiros são tão reconhecidos no exterior quanto Vik Muniz. Este paulista com sotaque carioca é uma das pessoas mais criativas em termos de artes plásticas que já nasceu neste solo gentil, mas que por questões comuns a todos nós (violência urbana), foi morar nos EUA.

No começo da década de 1980, ele trabalhava como publicitário e foi

Autorretrato de Vik Muniz - criação com comida e lixo

condecorado com um prêmio. Ao sair da premiação, acabou alvejado por uma pessoa que tinha se envolvido em uma briga.

Com o dinheiro que ele conseguiu de indenização, comprou uma passagem para Nova York e se radicou lá, definitivamente.

Deixou de fazer trabalhos em publicidade e passou a se dedicar a fazer arte contemporânea pura. Trabalhou com diversos materiais, desde algodão, areia, chocolate, fios de costura, arames e, mais recentemente, lixo.

Algumas obras de Vik são muito interessantes, além de engraçadas. Alguns exemplos podem ser vistos aqui, mas recomendo uma visita ao site do artista, que possui todas as galerias e informações das obras. O site é http://www.vikmuniz.net/www/index.html.

Crânio de palhaço

Joystick Ashanti

 

Mas não só de obras de museu que vive este artista. Recentemente ele se engajou em um projeto de fotografar e “revelar” as fotos de pessoas que trabalham no maior aterro sanitário do Brasil, no Rio de Janeiro, o lixão de Gramacho.

Este projeto virou um filme. Na verdade, um documentário. Ele tirou foto das pessoas e, com o próprio lixo que os catadores usam para encontrar material reciclável, Vik Muniz “revelou” as fotos. Assim, as fotos foram impressas em lixo, sendo fotografadas posteriormente e vendidas em um leilão em Londres.

Segue o trailer deste filme. Ele está concorrendo ao Oscar de melhor documentário. Creio que vale a pena vê-lo.

JR é um fotógrafo.

Não se tem informação direito de quem ele é. Seu anonimato é parte de sua performance.

Auto-retrato

Auto-retrato JR

Mas este fotógrafo decidiu fazer algumas coisas inovadoras.

Seu primeiro trabalho foi fotografar as pessoas dos subúrbios de Paris em 2004. Lá ele tirou fotos dos habitantes do lugar e decidiu imprimi-las em tamanho gigante, colando-as em vários pontos da cidade. O interessante é que ele não obteve o consentimento de ninguém para fazer aquilo, fazendo uma exposição de fotos ao céu aberto sem autorização nenhuma.

Suas fotos buscavam retratar as pessoas como elas são, fazendo caretas, poses e em situações cotidianas. Essa ideia em si não seria tão inovadora se este fotografo não a expandisse para outras coisas. A próxima parada foi, então, o Oriente Médio.

Chegando no Oriente Médio, ele tirou fotos de israelenses e palestinos, colando as fotos em tamanho gigante dos dois lados do conflito. Fotos de israelenses coladas nas portas e muros palestinos e fotos de caretas palestinas coladas em muros israelenses. E sem autorização governamental!

Foto de Palestino, Padre Católico e um Rabino por JR

Estas fotos são sensacionais, pois capturam a essência engraçada das pessoas, apesar dos conflitos existentes nos locais onde vivem.

Daí, ele foi à África. Lá, ele percebeu que os homens dominam as regras. Sendo assim, ele resolveu focar nas mulheres e seu sofrimento em países em guerra. O projeto “Women are heroes” virou um filme, apresentado em Cannes e o trailer está aqui:

JR veio também ao Brasil. Ele foi a algumas favelas do Rio de Janeiro e fotografou as pessoas lá também, espelhando o que havia feito no Oriente Médio e na África.

O mais interessante é que ele não busca mudar o mundo, mas está usando sua arte para expressá-lo e compreendê-lo.

JR recebeu o prêmio TED de inovação sobre sua obra. Entre ganhadores estão Bono, Bill Cinton, Jamie Oliver, entre outros.

Vale uma olhada no site do TED – http://www.tedprize.org/

Segue também o video em que JR descreve o seu trabalho.

A Intel, uma das maiores produtoras mundiais de microprocessadores, lançou um debate na revista “The Economist” acerca do  seguinte tema:

“Promover educação em matemática e ciências é o melhor jeito de estimular futuras inovações.”

Veja no site: http://www.economist.com/debate/days/view/579

Avaliando o assunto, posso dizer que gosto de matemática. Sempre gostei de ciências, apesar de biologia e química nunca terem sido meu forte. Meu apelo sempre foi maior para a Física. No entanto, sabemos que só estudar as matérias não garante inovação de forma determinada.

Senão, vejamos. Após ter estudado 5 anos na escola de engenharia, um estudante deveria ser capaz de inovar e sair com vários projetos que se tornariam produtos de sucesso nos mercados. Isto raramente acontece. E não porque os alunos não tenham sido competentes em conseguir vender suas ideias, algumas,inclusive, brilhantes. O fato é que o processo necessário para emplacar um produto é bastante custoso e, no mais das vezes, acaba fazendo a turma das faculdades desistir de tentar fazer o produto chegar às prateleiras.

Deste ponto, temos a seguinte conclusão: inventar algo não necessariamente significa inovar. Como Chris Trimble, professor de uma faculdade de negócios nos EUA (ver http://mba.tuck.dartmouth.edu/pages/faculty/chris.trimble/), inovação é o longo e difícil processo de tornar insight em impacto. Ou seja, é transformar uma ideia em algo rentável para as pessoas, gerando desejo das pessoas de adquirir o bem ou serviço.

Para isso, o que importa é não somente o inventor, mas também toda a estrutura por trás, que permite a venda dos produtos no mercado. A equipe de produção, compra de insumos, logística de entrega, vendas, atendimento pós-venda, etc.

E isto custa uma fábula de dinheiro.

No entanto, nada disso significa que devemos deixar de lado matemática e/ou ciências. De fato, estas matérias fazem parte de um complexo de cortes no conhecimento humano que são tão essenciais à nossa vida atual quanto o fazendeiro que produz os alimentos que comemos (na verdade, é mais provável que uma empresa de alta tecnologia em biologia esteja produzindo nossos alimentos, com base em pesquisas acadêmicas).

Todos lembram do Google, como tendo se tornado uma revolução nos meios de comunicação, e que teve sua origem em um algoritmo matemático elaborado academicamente em uma universidade. Matemática e ciências importam. Não creio que devamos atribuir um peso tão alto a elas como a Intel (que deve estar precisando de engenheiros…). É importante fomentar todos os tipos de conhecimento humano, não somente os dedicados para o mercado.

De qualquer forma, vale a pena uma lida no livro de Chris Trimble. Ele escreve em parceria com Vijay Govindarajan e explica vários aspectos da inovação nos dias de hoje. O foco principal é, no entanto, como conseguir criar um processo de inovação dentro das empresas, sem cair nas armadilhas de exagerar demais na criação e deixar de lado a implantação.

Vale a leitura ou uma análise mais resumida do site “The Economist”. O site é http://www.economist.com/node/16888745?story_id=16888745

Começou uma série extremamente interessante no Discovery Channel. Chama-se “O universo de Stephen Hawking”.

Para quem não conhece esse indivíduo singular, ele é um dos maiores gênios

Stephen Hawking

de nosso tempo, ocupando a cadeira de Professor Lucasiano de Matemática na Universidade de Cambridge, cadeira que um dia foi de Sir Isaac Newton.

Hawking conseguiu o que parecia bastante improvável: chamar atenção das pessoas para temas como buracos negros, inconsistências temporais e mecânica quântica.

Assim como ele, acredito que o universo não é aleatório. Hawking vem tentando conciliar dois campos aparentemente divergentes da Física Moderna. A cosmologia, ou física do cosmos, dos grandes objetos espaciais e do universo como um todo, e a física quântica, que estuda o mundo subatômico. Ele acredita que existe uma integração entre esses campos, pois o universo é regido por leis válidas para todos os “tamanhos” de corpos, sejam planetas ou partículas.

Mas e o caos? Alguns acreditam que o universo é aleatório, ou seja, não existe uma lei que determina os resultados a partir de eventos passados. Outros, como Hawking, não acreditam que a aleatoriedade aparente dos resultados de eventos seja algo real. Assim como Einstein, ele acredita que “Deus não joga dados com o universo”.

Estou longe de ser um físico, mas também não acredito no caos. Pelo menos não mais do que acredito que ele seja apenas uma “impressão” humana, da mesma forma que acreditávamos que a Terra era plana.

Em termos lógicos, acredito no seguinte: nós somos limitados. Não temos condições de entender o universo que nos rodeia. Para entender as leis que regem o universo, teríamos que entender todo o caminho que ele fez até hoje.

Padrões caóticos somente porque não entendemos sua interdependência

Acredito no conceito de “path dependence”, ou seja, dependência do percurso de eventos. As coisas são dependentes de eventos que remontam o início do universo. Somente com esta informação, poderíamos avaliar como as coisas são o que são atualmente. Ainda mais, precisaríamos entender completamente como as diferentes forças do universo se inter-relacionam, a todo o momento.

Como não somos velhos o suficiente para entender o mundo desde sua criação, nem temos onipresença para enxergar todas as inter-relações existentes, não somos capazes de identificar a natureza determinística do universo. Isto significa que não captamos a cadeia de infinitos eventos que nos fizeram estar aqui nos dias de hoje.

Linha do Tempo do Universo - 13,7 bilhões de anos desde o Big Bang (Fonte: Nasa)

Além disso, ainda que conseguíssemos ter toda a informação (como um filme de todos os lugares do universo passando por todos os tempos), não teríamos capacidade mental para processar tudo isso. É muita informação para o córtex cerebral humano.

Assim sendo, vemos o universo de forma fragmentada, cortada no tempo e limitada no espaço que ocupamos. Desta forma, ele parece caótico, ou não relacionado com nenhum evento anterior.

O fato de não conseguirmos visualizar o universo como um todo não significa, portanto, que ele seja caótico. Significa apenas que ele é complexo demais para nós.

Hawking usa, então, esta conclusão para estimar que existe vida em outros planetas, que é possível viajar no tempo e que é possível que um dia façamos viagens interplanetárias tão longas quanto sair da galáxia no período de vida de um ser humano.

Gosto de pensar sobre isso. Recomendo, pois, que assistam o Discovery Channel de domingo às 22h00 para ver “O Universo de Stephen Hawking”. Caso você não possua tv a cabo, existem vídeos na internet, principalmente no site do canal. Segue o link:

http://www.yourdiscovery.com/video/playlists/stephen-hawkings-universe/

Segue a chamada comercial do programa e também um vídeo no TED Talks em que Hawking fala sobre vida extraterrestre. Apreciem.

Quando comecei o curso de economia, tive minhas primeiras aulas de Macroeconomia seguindo o livro de Sachs e Larrain.

Neste livro, os autores explicam que existe o que eles chamam

Livro "Macroeconomia", de Jeffrey Sachs e Felipe Larrain

de “restrição orçamentária intertemporal”. De forma sucinta, este termo bonito do economês significa que “as famílias podem consumir mais do que sua renda em um determinado período, mas, no decorrer de toda a sua vida evidentemente não vão poder consumir mais do que os recursos que têm.” (SACHS, J. LARRAIN, F. Macroeconomia, p. 93, meus negritos). Ou seja, você não pode gastar mais do que têm no banco, seja em dinheiro na conta, seja no crédito que lhe foi dado. Caso você gaste mais, irá ter que pagar no futuro.

Bom, se não se pode consumir mais do que os recursos que se têm, como entender nosso consumo dos recursos naturais acima da capacidade do planeta? A resposta é óbvia, porém desagradável: estamos consumindo os recursos que nossos filhos e netos não consumirão.

Esta situação me chama bastante a atenção, pois minha filha tem hoje 6 meses de idade.  Em 2050 ela terá 40 anos e, se nada for feito, viverá em um planeta com 9 bilhões de pessoas, com recursos que não serão suficientes para suprir a fome e a sede dela e nem do restante da raça humana. Assim, em um período de uma geração, passaremos de uma condição de relativa tranquilidade alimentar, proveniente da revolução verde do século XX, para uma situação de extrema instabilidade, com pessoas de mais e comida e água de menos.

Vale, então, a leitura do artigo de Jeffrey Sachs no periódico Scientific American que eu reproduzo aqui, mas que pode (e deve) ser acessado diretamente no site da revista (http://www2.uol.com.br/sciam/).

Creio que temos muito trabalho a fazer.

Artigos

edição 92 – Janeiro 2010

Rompendo os Limites do Planeta

Desafios do controle populacional e da produção de alimentos precisam ser vencidos de forma conjunta
por Jeffrey Sachs
Estamos nos expulsando de nosso próprio planeta. Recentemente, na edição de setembro de 2009 da revista Nature, Johan Rockström e colegas propuseram os dez “limites planetários”, para definir os níveis seguros da atividade humana (a Scientific American faz parte do Nature Publishing Group). Nesses limites se incluem emissões críticas de gases causadores do efeito estufa; perda de biodiversidade; troca, em todo o mundo, da vegetação natural por plantação; e outros grandes impactos sobre os ecossistemas terrestres. A humanidade já ultrapassou vários desses marcos e caminha para extrapolar a maior parte dos restantes. E a demanda crescente por alimento contribui ainda mais para essas transgressões.

A revolução verde, responsável pelo aumento da produtividade dos grãos, deu à humanidade um certo tempo para respirar, mas o crescimento populacional contínuo e a demanda maior por carne abreviam essa fase. O pai dessa revolução, Norman Borlaug, morto em setembro do ano passado, aos 95 anos, ressaltou em 1970 exatamente essa ideia, ao aceitar o Prêmio Nobel da Paz: “Não haverá progresso duradouro na batalha contra a fome se as agências que lutam pelo aumento da produção alimentar e aquelas pró-controle populacional não unirem forças”.

Porém, essa união de forças é, na melhor das hipóteses, inconsistente e, por vezes, inexistente. Desde 1970, a população saltou de 3,7 bilhões para 6,9 bilhões e continua a crescer a uma
taxa anual de 80 milhões de pessoas. A produção de alimentos por habitante do planeta diminuiu em algumas grandes regiões, especialmente na África subsaariana. Na Índia, a duplicação
populacional absorveu quase totalmente o aumento da produtividade dos grãos.

A produção alimentar é responsável por um terço de toda a emissão de gases do efeito estufa; isso inclui os poluentes gerados pelos combustíveis fósseis utilizados na preparação e transporte dos alimentos, o dióxido de carbono liberado pela aragem da terra para a agricultura e pastagem, o metano produzido pelos arrozais e rebanhos de ruminantes, bem como o óxido nitroso proveniente do uso de fertilizantes.

Por devastar as matas, a produção de alimentos também responde por muito da perda de biodiversidade. Os fertilizantes químicos formam grandes depósitos de nitrogênio e fósforo, que agora destroem esteiros – trecho de rio ou mar que adentra na terra – de centenas de sistemas fluviais e ameaçando a química oceânica. Cerca de 70% do consumo mundial de água é destinado à produção alimentar, causando o esgotamento dos lençóis freáticos e uso ecologicamente predatório de água doce, desde a Califórnia até a planície indo-gangética, passando pela Ásia central e norte da China.

A revolução verde, em suma, não neutralizou os perigosos efeitos colaterais de um boom populacional humano, que se potencializarão ainda mais quando a população ultrapassar os 7 bilhões em 2012 e não parar de crescer, prevendo-se chegar aos 9 bilhões, em 2046. O consumo per capita de carne também aumenta. A carne bovina é uma das maiores ameaças, pois o gado
precisa consumir até 16 kg de grãos para produzir 1 kg de carne e emite grandes quantidades de metano. Além disso, o fertilizante utilizado nas plantações destinadas à alimentação desses animais contribui em muito para a produção de óxido nitroso.

Não basta somente produzir mais alimentos; devemos, ao mesmo tempo, estabilizar a população mundial e reduzir as consequências ecológicas da produção alimentar – um desafio triplo. Uma queda brusca e voluntária nas taxas de fertilidade de países subdesenvolvidos e em desenvolvimento – proporcionada por um maior acesso ao planejamento familiar, diminuição do índice de mortalidade infantil e educação de meninas – poderiam, em 2050, firmar a população em cerca de 8 bilhões de pessoas.

Incentivos financeiros a comunidades carentes, a fim de impedir o desmatamento, poderiam salvar hábitats de espécies. Sistemas de plantio direto e outros métodos preservariam não só o solo, mas também a biodiversidade. O uso de fertilizantes mais eficientes reduziria o transporte excessivo de nitrogênio e fósforo. Aperfeiçoamentos na irrigação e nas variedades de sementes poupariam água e reduziriam outras premências ecológicas. E uma dieta pobre em carne bovina conservaria os ecossistemas ao mesmo tempo em que melhoraria a saúde humana.

Essas mudanças exigirão um grande empenho (ainda a ser instigado) não só do setor público como do privado. Ao rememorarmos as grandes conquistas de Borlaug, devemos também redobrar nossos esforços para solucionar suas premonições. Está passando a oportunidade de alcançarmos um desenvolvimento sustentável.

Jeffrey Sachs é diretor do Earth Institute da Universidade de Columbia (www.earth.columbia.edu).

Avaliando os acontecimentos dos últimos tempos (Dubai, Cop-15, Haiti, etc.), percebo que somos capazes de muitas coisas irracionais – como inutilizar o planeta com o aquecimento global – e também extremamente lógicas e humanitárias, como ajudar as vítimas do terremoto no Haiti.

Embora estes dois tipos de comportamento (destrutivo – construtivo) sejam comuns em nosso dia a dia, ainda nos perguntamos por que não podemos ser  sempre construtivos ou sempre pacíficos.

Jill Taylor, uma neurocientista da universidade de Harvard, nos EUA, estuda o cérebro humano. Ela iniciou sua pesquisa para tentar entender a condição do seu irmão, que teve um diagnóstico de esquizofrenia.

Após estudar muito e ter um vasto conhecimento sobre o funcionamento das funções cerebrais, Jill teve sua própria experiência neurosensorial. Ela teve um derrame no lado esquerdo do cérebro que controla o pensamento racional e nos faz ter um contato com a realidade.

A sua experiência é algo realmente fantástico que vale a pena ser visto. A versão com legendas em português está quebrada em três vídeos.

O que esta cientista nos revela é que nós mesmos somos seres duais, com duas metades do cérebro com atitudes e funções diametralmente diferentes.

É normal que o mesmo líder norte-americano (George W. Bush) que iniciou uma guerra contra o terror de forma tão desmedida e irresponsável, esteja agora dentre aqueles que querem ajudar o Haiti em sua catástrofe natural? É normal sermos ao mesmo tempo irracionais e bondosos, guerreiros e pacíficos, sem isto parecer uma hipocrisia? Bom, de acordo com o que foi visto por Jill Taylor, sim. Isto porque somos capazes de atos de extrema e vileza, ao mesmo tempo que somos capazes de grandes ações humanitárias e bondosas.

Creio que ela tem razão. O que precisamos é tentar buscar dentro de cada um de nós a beleza do nosso lado direito do cérebro.

Sabemos, e não é de hoje, que nosso país não valoriza a inovação, a criatividade e, sobretudo, a educação como meios de aumentar o nível sócio-econômico da população.

Temos, no entanto, uma série de pessoas inventivas e capazes de desenvolver ideias tão boas quanto nos países mais afeitos a revoluções tecnológicas.

Entretanto, a falta de estrutura – legislação ultrapassada, somada a dificuldade a crédito e educação de baixa qualidade (veja que não chamo isto de apoio governamental, somente de estrutura) – acaba por fazer com que o número de pessoas aptas a ter acesso a um laboratório de computação, química, física, dança, ou o que quer que seja, seja diminuto. Isto tira oportunidades de inovação imensas da economia do país, dificultando saltos de qualidade nas questões tecnológicas e científicas que temos que enfrentar.

Surgem, no entanto, alguns “Pelés” da inovação. São pessoas que por si só, mesmo com o mundo inteiro atrapalhando, conseguem se sobressair e desenvolver soluções para nossos problemas. Estes herois resolvem pontualmente os problemas, mas não se deve fiar o futuro do país nestes casos isolados. Uma política educacional decente, muito melhor do que está aí, deve ser pensada.

Enquanto isso, fiquemos com nossos “Pelés” do mundo da inovação. Segue o exemplo de um no artigo de Gilberto Dimenstein, publicado na Folha de São Paulo, em outubro de 2009, demonstrando que ainda temos esperança:

São Paulo, domingo, 04 de outubro de 2009

GILBERTO DIMENSTEIN

Como surgem inventores. E milionários


Romero Rodrigues transformou sua vocação para a informática em um negócio de US$ 342 milhões


COM O DINHEIRO que ganhava do estágio no Laboratório de Arquitetura e Redes de Computadores (Larc), da Poli, Romero Rodrigues conseguia economizar R$ 100 por mês, às vezes só dava R$ 50, para investir numa experiência em internet.
Com mais três colegas -dois da Poli, um da FGV-, aplicava R$ 300 mensais. Na semana passada, o que sobrou desse passado foram só os três primeiros dígitos. Uma parte da empresa foi vendida a um grupo estrangeiro por US$ 342 milhões.
A ideia surgiu quando eles, em 1999, perceberam que não havia na internet um jeito de comparar preços de produtos vendidos nas lojas. Nascia, assim, o Buscapé.
Perguntei a Romero sobre seu prazer de descobrir coisas. No relato sobre sua vida, dá para perceber o modelo que o ajudou a fazer tanto sucesso em tão pouco tempo -há anos registro casos de inovadores e, quase sempre, noto um padrão que se repete.
Antes que me confundam com escritor de autoajuda, vou logo avisando. Não vou dar uma receita, mas apenas mostrar que os inovadores de destaque têm pontos em comum.

Comecei perguntando sobre a infância. Romero lembrou-se da paixão que tinha por um brinquedo chamado “O Alquimista”, que misturava produtos químicos. “Gostava tanto, mas tanto, que economizava cada gota dos vidrinhos. Foi, durante muito tempo, meu maior tesouro.”
Puxando pela memória, ele se lembrou de que tinha mania de desmontar os aparelhos que encontrava pela frente e, depois, remontá-los -o que fazia de seu quarto uma espécie de laboratório. “Nada me seduziu tanto quanto o computador.”
Aos 12, montou, sozinho, em casa, seu primeiro jogo no computador, em que bichos passavam por túneis.

Como se vê, Romero era um menino curioso e, desde cedo, desenvolveu o encanto pela experiência, encontrando uma vocação.
Aparece aí mais uma característica. O prazer não estava em ganhar dinheiro, mas em produzir novidades. “O dinheiro foi consequência.” Na frente, estava um sonho que, ao contrário das empresas, tem uma contabilidade imaterial guiada apenas pela emoção.

Dificilmente, ele não iria muito longe se fosse apenas um curioso. Ser criança, afinal, é ser curioso.
Romero frequentou uma das melhores escolas da cidade de São Paulo (Visconde de Porto Seguro), onde teve as primeiras aulas de computação e a chance de mergulhar nos laboratórios. Sem isso, teria dificuldade de entrar na USP e obter uma base teórica sólida para fazer programação na internet.
Sabia, porém, transformar informação que vinha da sala de aula em conhecimento, ou seja, algo prático.

Notam-se curiosidade natural, inteligência acima da média para pelo menos uma área (no caso, a computação), boa formação escolar, apoio familiar. Mas falta algo -e, na minha visão, decisivo. Falta o mestre, aquela figura indispensável que ajuda a canalizar a curiosidade.
Quando lhe perguntei sobre os mestres que o estimularam mais, a resposta veio rapidamente: o pai, também chamado Romero. E também engenheiro. Não se incomodava com os aparelhos desconstruídos, espalhados pela casa. Pelo contrário, mostrava-se orgulhoso. “Via o esforço do meu pai em pagar a mensalidade.”

Muitos dos colegas de Romero ganharam um carro quando entraram na faculdade. Com ele, foi diferente. O pai raspou as economias para dar-lhe um moderno computador.
Justamente com esse computador que, aos poucos, foi ficando velho, Romero montou o programa de buscas na internet, agora com 50 milhões de usuários -e, com isso, os R$ 300 mensais viraram, na semana passada, US$ 342 milhões.

É mais um exemplo a mostrar que nada pode ser mais importante num país do que o estímulo à inovação -é por esse ângulo que se pode medir a tragédia que significa a falta de professores em ciências e a incapacidade de mostrar como a teoria se aplica ao cotidiano.

A questão de ética nas empresas tornou-se uma moda que, não mais que de repente, toda empresa precisa agora buscar e possuir.

Entendo, no entanto, que a questão da ética é mais profunda do que estamos vendo nos dias de hoje. Ela envolve aspectos além da mera atividade de responsabilidade social que cada empresa busca fazer, nos campos jurídico, econômico, ambiental e interno. Não devemos confundir estes conceitos, como demonstrarei aqui.

Mas, como diria Jack, vamos por partes.

Em primeiro lugar, é comum avaliar a questão ética face aos preceitos jurídicos. Assim, se uma empresa cumpre a lei, ela é consequentemente ética. Entretanto, o fato de se respeitar a legislação não faz de uma pessoa ou uma empresa automaticamente ética. Ao contrário, é possível encontrar-se empresas que, mesmo adequadas às normas legais, realizaram ações que feriram em muito os preceitos éticos econômico-sociais e causaram grande estrago no mundo.

Deixe-me dar um pequeno exemplo. Ao estruturar um fundo de investimentos nos EUA é necessário respeitar uma série de regulamentos da temida SEC (Security Exchange Comission) – a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) norte-americana. Bem, o caso é que fundos extremamente bem cotados, que geravam rentabilidade de milhões de dólares para investidores no mundo inteiro, acabaram provocando uma das maiores crises financeiras em décadas[1]. No entanto, estes fundos cumpriam com as exigências legais e regulamentares dos órgãos fiscalizadores norte-americanos.

O que deu errado, então? Bom, muita coisa. Para começar, a ciranda financeira em que o mundo estava metido não permitia que os operadores financeiros parassem e pensassem: “puxa, vender casas e imóveis de luxo a pessoas que não podem pagar e, depois, empacotar estas dívidas e pulverizá-las no mercado pode não ser um bom investimento, afinal.” Estes operadores precisavam dar o retorno que todos no mercado estavam dando com o mesmo tipo de ativo. Se eles não fizessem aquilo, outros fariam e lhes retirariam esta fatia do mercado. Como é possível, então, a posteriori, achar que o Goldman Sachs, o Citibank, o Santander e o falido Lehman Brothers – só para citar alguns – eram anti-éticos se, naquele momento, faziam o que era esperado deles? Neste ponto, a responsabilidade social pode até estar de acordo, mas as atividades eram anti-eticas em essência.

Avaliemos agora a vertente econômica da responsabilidade social e da ética.

Certa vez, o presidente da França, Georges Pompidou, disse que há três caminhos para se cair em desgraça: o mais rápido é o jogo; o mais agradável são as mulheres; o mais seguro é consultar um economista[2]. A economia nada mais é do que o estudo das consequencias não-intencionais das ações humanas. Portanto, atribuir uma visão simplista da economia, em que os lucros e empregos são desejáveis, não leva em conta um pano de fundo cada vez mais agressivo no mercado e nas relações econômicas.

Dizer que hoje as empresas operam de forma ética, mesmo considerando que existe alguma legislação para abuso de monopólios e oligopólios, é acreditar que as galinhas estarão seguras com os lobos tomando conta. As empresas monopolistas oprimem os ganhos das outras por maior participação de mercado, pouco se importando com lucros e empregos. Às vezes, para manter-se como monopólio, as empresas diminuem a eficiência operacional, impõem barreiras a novos competidores e fazem lobby no congresso para impedir a entrada de estrangeiros no mercado. Atitudes como estas são comuns e não olhar para isso é, no mínimo, ingenuidade. De novo, a responsabilidade de gerar lucro da empresa está resguardada, mas esmagar pequenos concorrentes pode até ser divertido, mas não é ético.

Quanto à questão ambiental, tenho uma simples palavra: Petrobras. Não sou contra a empresa em si, apesar de achá-la ineficiente e influenciada negativamente pelo governo (seu maior acionista). O ponto é que existe uma série de problemas no direcionamento estratégico da empresa que põem em risco sua sustentabilidade e a sustentabilidade do planeta no longo prazo.

Sua missão, como descrita em comerciais de TV, é prover energia. No entanto, a Petrobras consegue, em um momento de flagrante problema ambiental, focar seus esforços para extrair mais combustível fóssil não renovável (petróleo) de profundezas abissais, sem nenhuma preocupação com o impacto futuro deste tipo de tecnologia. É evidente que estes combustíveis serão descartados brevemente em face das novas alternativas renováveis (solar, eólica, hidrelétrica, etc.), menos poluentes e menos danosas para o meio ambiente. É claro que atualmente ninguém diz que a Petrobras é anti-ética com o meio ambiente. Talvez, em um futuro breve, ouviremos este discurso depois de bilhões de reais terem sido jogados fora.

Por fim, vale a pena comentar algo sobre o modo como as empresas trabalham atualmente.

Há uma tendência clara de crescimento populacional no planeta. Estimativas dão conta de que a população mundial se estabilize em torno de 9,5 bilhões de almas[3]. Se a capacidade de se gerar emprego para todos os 6 bilhões de habitantes já é ínfima hoje, imagine em 50 anos, quando atingirmos este pico de pessoas. Como exigir que países como a China deixem de utilizar mão-de-obra irrisoriamente paga para fabricação de produtos que serão utilizados por todos? Quanto mais pessoas no mundo houver, maior a disponibilidade de mão-de-obra para as empresas, o que facilitará cada vez mais a perda dos direitos trabalhistas (se é que existe isso em algumas partes do mundo). Este quadro poderá se deteriorar até uma situação em que as empresas que não reduzirem seus custos de mão-de-obra ficarão à mercê de uma falência ou coisa que o valha. Neste caso, a empresa que contrata funcionários de menor valor para seus postos de trabalho, ou terceiriza parte de sua estrutura não essencial não deixa de possuir responsabilidade social, pois age de acordo com as possibilidades estabelecidas para seu público interno, ou seja, preservando sua parte essencial.

Creio que todos que ainda lêem esta análise já entenderam a esta altura onde quero chegar.

Ter responsabilidade social não significa necessariamente ser ético.

Para Aristóteles, existia a pessoa virtuosa. O virtuoso era aquele que agia em função do que acreditava ser o bem puro. Este era o ético, aquele que agia de acordo com a natureza boa das coisas[4]. A ética grega, foi substituída pela ética pragmática de Kant, em que existia um imperativo do que era bom, externo aos seres humanos (geralmente em Deus). A escolha ética era feita por respeito ao que é certo. Existe uma terceira vertente que diz que o certo depende da maximização utilitarista, ou seja, do que é maximiza o prazer e diminui a dor das pessoas, respeitando os limites e a felicidade do outro.

A definição utilitarista, apesar de razoável, nos põe a seguinte contradição: se eu consigo maximizar meu bem-estar ganhando mais dinheiro, aumentando a felicidade (ou atendendo à necessidade) do outro, vendendo um bem, devo fazer isso. A implicação é que caso eu esteja vendendo um produto danoso à saúde em longo prazo (vamos dizer, cigarros), apesar de eu estar maximizando a felicidade do outro, estou condenando as pessoas a fazer algo que não farão bem a elas futuramente, mesmo que aumente a felicidade no presente.

O ponto aqui é o seguinte: a questão utilitarista atribui um sentido ético a qualquer transação de qualquer mercadoria, independente se ela é uma droga ilícita, lícita, ou um serviço digno ou degradante (p.ex. prostituição – afinal de contas a prostituta ganha seu dinheiro e o homem recebe prazer em troca).

Por fim, para demonstrar como a questão ética ainda não está resolvida em termos práticos, segue uma reportagem sobre a questão do consumo de cigarros no mundo. As empresas de cigarro são as que mais têm se preocupado com responsabilidade social e ética. Considerando a responsabilidade social fundamentada em quatro pilares (meio ambiente, economia, legalidade e respeito ao público interno) e a ética utilitarista, esta empresa atende a todos os requisitos, passando no teste ético / responsável socialmente. No entanto, atingir este número de 1 em cada 5 pessoas morrendo de doenças causadas pelo fumo é algo a se pensar.

 

Oct 29th 2009
From Economist.com

Where smoking kills most people[5]

NEARLY one in five deaths in rich countries is caused by smoking, according to new data released this week by the World Health Organisation. In 2004, the latest year for which data are available, tobacco use killed an estimated 5.1m people worldwide, or one in every eight deaths of adults aged 30 and over. Residents of richer countries are suffering more now because they have been smoking longer: cancers and chronic respiratory diseases caused by tobacco smoke take a long time to develop. Deaths in poor countries, where many more people have taken on rich-world smoking habits in recent decades, are predicted to rise dramatically in the next 20 years.

Porcentagem de mortes por doenças do fumo (Fonte: OMS)


[1] São os fundos subprime, que geraram uma onda de turbulências financeiras que já duram um ano.

[2] Fonte: Roberto Campos. A lanterna na popa – memórias. Vol 2. Topbooks: p.1292.

[3] Fonte: Al Gore. Documentário: Uma verdade inconveniente. Paramount: Nov/2007.

[4] Aristóteles. Ética a Nicômaco. Extraído do texto de Conard, Skoble e Irwin, Os Simpsons e a Filosofia, p.8.

[5] Acessível no site HTTP://www.economist.com


Se você pudesse dizer algo aos maiores líderes mundiais, o que diria?

É isso que Ban Ki-moon, Secretário-Geral da ONU, quer saber.

A ONU está fazendo um concurso de vídeo no Youtube, chamado Citizen Ambassador (Embaixador Cidadão), para se aproximar mais da população mundial. Assim, criou um concurso que vai escolher os cinco melhores vídeos que respondam como fazer deste mundo um lugar melhor e mais seguro para se viver.

O problema deste tipo de iniciativa é que ela não endereça nenhuma questão essencial da falta de representatividade das Nações Unidas. O fato de esta organização não ter nenhuma legitimidade jurídica, como se fosse um super-estado ou algo do gênero, faz com que suas iniciativas dependam completamente dos estados-membro. Assim, se os EUA quiserem atacar alguma outra nação, se a China não cumprir as cláusulas de redução de gases de efeito estuda, se Israel e Palestina ficarem em constante conflito, há muito pouco que a organização pode fazer. (*)

Isto não significa que a ONU seja um mero organismo de fachada. Sua criação respondeu a uma necessidade de organização das nações para criação de um espaço de conversa política que fosse adequado para dirimir as tensões pré-guerras. Ainda hoje sua atuação em operações de manutenção de paz (das quais o Brasil faz parte na operação do Haiti) é bem vista e ajuda a pacificar zonas em guerra e a dirimir o impacto nas populações civis.

De qualquer forma, vale a indicação. Vejam o vídeo:

(*) De fato, algumas ações importantes da ONU podem ser acessadas no site da própria organização: http://un.org/en/peace/